em Drenagem Urbana, Meio Ambiente, Não categorizado, Recursos Hídricos

Grande parte de nossas discussões aqui no blog Cidade das Águas aborda o controle das inundações e projetos de drenagem urbana. Já apresentamos diversas medidas importantes a serem adotadas nos programas de combate às enchentes, mostrando tanto algumas medidas estruturais, como os pavimentos permeáveis, jardins de chuva, trincheiras de infiltração, quanto algumas medidas não-estruturais, como os sistemas de previsão e alerta, o zoneamento das áreas inundáveis e a importância da preservação das Áreas de Proteção Permanente dos rios.

Nessa linha, também apresentamos algumas vantagens da abordagem sustentável da drenagem urbana, adotando medidas compensatórias, quando comparada com as tradicionais medidas de canalização.

Ao longo dessas discussões, fica bem evidente a importância da consideração das medidas não-estruturais na gestão das cheias. Essa evidência não é novidade e já na década de 70, aqui no Brasil, era indicada como imprescindível para o planejamento de programas de controle de inundações.

Nos EUA, na década de 30, havia uma lei federal que “identificava a natureza pública dos programas de redução de enchentes e caracterizava a implantação de medidas físicas ou estruturais como um meio de reduzir estes danos” (Gestão de Águas Pluviais Urbanas – 2005). Porém, algumas décadas depois, no início dos anos 60, o governo norte americano assumiu a ineficiência das medidas estruturais como solução para os problemas de enchentes, indicando a necessidade de adoção de medidas não-estruturais, como o zoneamento das áreas de risco:

As limitações da presente (em 1962) Política Nacional de Controle de Enchentes, a qual é baseada principalmente na construção de obras de controle de inundação, são reconhecidas neste relatório, o qual enfatiza a necessidade para a regulamentação das várzeas de inundação como uma parte essencial de um plano racional de redução das perdas das cheiasAmerican  Society of Civil Engineers, 1962.

Recentemente, recebi uma apresentação do Ministério das Cidades com o Plano Nacional de Gestão de Riscos e Resposta a Desastres Naturais – 2012-2014. Neste plano, são previstos investimentos de R$18,8 bilhões, divididos em:

  • PREVENÇÃO: Obras estruturantes
  • MAPEAMENTO: Áreas de risco
  • MONITORAMENTO E ALERTA: Estruturação da rede nacional
  • RESPOSA: Socorro, assistência e reconstrução.

Após apresentar cada uma dessas atividades para o a gestão dos riscos no país, o MinCidades apresenta a divisão orçamentária para os investimentos previstos, alocando R$362 milhões para monitoramento, R$162 milhões para mapeamento, R$2,6 bilhões para resposta e nada mais, nada menos que R$15,6 bilhões para prevenção, onde estão as obras…

Plano Nacional de Gestão de Riscos e Resposta a Desastres Naturais – 2012-2014 – Ministério das Cidades

Esses números me chamaram a atenção e foram minha motivação para o post de hoje. É indiscutível a imensa necessidade de investimentos em obras estruturantes que nosso país apresenta hoje, resultado de décadas de falta de investimentos suficientes nos setores de infraestrutura. Com certeza nossas cidades demandam um grande volume de obras para correção e melhoria dos sistemas de drenagem e implantação de medidas de combate e controle de inundações.

Mas será que destinar a expressiva parcela de 2,8% dessa grana toda para as atividades de mapeamento, monitoramento e alerta dos riscos em um país com sérias deficiências de cobertura de informações é realmente o ideal? Considere que dentro dessas atividades, segundo a apresentação do MinCidades, estão:

  • Expansão da rede de observação: radares, pluviômetros, estações hidrológicas, sensores…
  • Implantação e manutenção de centros de gerenciamentos de riscos e desastres
  • Investimentos em tecnologia da informação para comunicação dos alertas, articulação dos órgãos envolvidos, compartilhamentos de informações…
  • Força nacional do SUS: capacitação de profissionais, hospitais de campanha, equipes em regime de plantão…
  • Força nacional de emergência: profissionais de diferentes áreas do conhecimento capacitados para agir em emergências, como geólogos, hidrólogos, engenheiros, agentes da defesa civil, assistentes sociais…
  • Forças armadas: equipamentos como pontes móveis, viaturas, embarcações, tratores…

Essa divisão, com tanto dinheiro destinado à execução de obras, deve despertar algumas dúvidas e cautelas. Quem são os grandes beneficiários de uma política fortemente baseada em investimentos em grandes obras estruturantes?

Abraços.

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