No post de hoje, vou falar um pouco sobre o trabalho que venho desenvolvendo em minha tese de doutorado, na COPPE/UFRJ. Estou estudando a Requalificação Fluvial em Áreas Urbanas, tema de outros posts aqui no nosso blog (“A Difícil Arte de Requalificar um Rio Urbano“, “Um belo Exemplo de Requalificação Fluvial Urbana na Cidade Olímpica de Londres“).
Para aplicar as minhas propostas, trabalho com um caso de estudo localizado na Baixada Fluminense, mais precisamente no município de Mesquita: o rio Dona Eugênia.
O rio possui sua nascente no município de Nova Iguaçu, mais precisamente, no interior da APA de Gericinó-Mendanha. Próximo à área, localiza-se o Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu, criado em 1998, na Serra de Madureira (na vertente iguaçuana). O rio tem 10 km de extensão, atravessando cerca de 6 Km do tecido urbano do município de Mesquita, até desaguar no rio Sarapuí, que divide este município e o de Nilópolis.
Ao longo de seus 10 km de extensão, o rio atravessa trechos de caráter diferenciados, nos quais a natureza ainda se apresenta de forma preservada, na sua parte alta, bem como apresenta trechos totalmente degradados ao cruzar o tecido urbano. E é esse o ponto que eu gostaria de explorar aqui: a existência de “dois rios diferentes”.
Em seu trecho urbano, o rio enfrenta muitos problemas, sendo os principais:
- Ocupação intensa e irregular de margens.
- Casas nas margens “canalizam” o rio.
- Assoreamento do rio em diversos pontos.
- Lançamento de esgoto e lixo no rio, com visível degradação ambiental.
- Problema recorrente de enchentes, afetando cerca de 80% de sua população.
- Degradação do ambiente urbano.
A própria população, provavelmente por falta de informação, contribui para a degradação do rio Dona Eugênia, lançando lixo e fazendo ligações clandestinas de esgoto no mesmo. Essa mesma população, claro, tem repulsa ao corpo hídrico que funciona, a seu ver, como “condutor de lixo e esgoto a céu aberto”.
Por outro lado, é curioso perceber que grande parte da população local utiliza o mesmo rio como lazer na área do Parque Municipal, percebendo, ali, a importância do ambiente mais natural. Cabe destacar que grande parte da bacia (mais de 60%) está localizada nessa área de proteção ambiental. O rio nasce em área natural, limpa, praticamente livre de degradação. Ali não há lançamento de esgotos ou de resíduos sólidos em seu leito. Além disso, há a presença de vegetação conservada.
Muitas pessoas não perceberam que o mesmo rio que repudiam, na área urbana, é o que lhes proporciona momentos de lazer, na área natural…
Em pesquisa recente, realizada pelo grupo de pesquisa coordenado pela Profª Ana Lúcia Britto (PROURB/UFRJ), em que diversos moradores da localidade foram entrevistados, percebeu-se que:
- A maioria da população entrevistada entende que há algum problema relacionado à poluição dos rios locais, embora sem conhecimento sobre o que exatamente pode ser a fonte desta poluição.
- Uma quantidade não desprezível de pessoas entende que o rio ideal seria aquele concretado, o que provavelmente mostra, de forma intrínseca, um desejo de se afastar do rio poluído e degradado (leia “Cobrir rios é o mesmo que esconder sujeira embaixo do tapete“).
- A maioria dos entrevistados não sabe o nome do rio com o qual convivem.
- Identificação do rio como sendo um “valão”: o termo valão, na linguagem popular, é utilizado para cursos d’água degradados e que funcionam como “condutores de lixo e esgoto” (leia: “Rio ou Valão?“).
- Há, dentre os entrevistados, vontade de ver o rio recuperado, com água limpa.
Os resultados obtidos por essa pesquisa sinalizam que há, por parte dos moradores, vontade de ter um ambiente mais agradável para viver. Talvez a chave para essa questão não esteja apenas nas obras de engenharia, isoladas, mas sim em proporcionar informação àqueles que convivem com o rio.
Leia mais em: “A Arte de Viver da Fé“.
Até o próximo post!