Imagem de capa: State of California – California Department of Water Resources, disponível em Wikipedia.
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Desde fevereiro deste ano, a barragem de Oroville, no rio Feather, localizada nos pés da Serra Nevada, estado da Califórnia, apresenta grave risco de ruptura, por danos em seu vertedor principal. A situação alarmante acende a luz amarela sobre duas questões que envolvem as discussões acerca da tragédia potencial: conflito de uso do reservatório e necessidade de atualização de regras de operação.
Em algumas matérias de jornais americanos, a explicação para a situação de risco de ruptura encontrada se dá pela ocorrência de fortes chuvas e nevascas durante o inverno sobre a bacia de montante ao reservatório da barragem, o Lago de Oroville. Durante uma grande cheia no mês passado, o rápido aumento da elevação do nível d’água no reservatório fez com que o vertedor principal da barragem fosse acionado, provocando uma enorme cratera na estrutura. O vertedor foi isolado temporariamente, para possibilitar a avaliação dos danos estruturais. Porém, a continuada e rápida elevação do nível d’água do lago acabou por ativar o vertedor de emergência, situação inédita em toda a história de existência da barragem de Oroville. (Is there too much water behind Oroville Dam?)
Quando as autoridades perceberam o risco de ruptura da estrutura, um enorme plano de evacuação foi acionado, atingindo quase 200.000 moradores do vale de jusante da barragem. (BBC Brasil)
Essa situação crítica trouxe à tona uma discussão antes limitada aos mais interessados e próximos à gestão dos recursos hídricos estadunidenses. No ano de 2006, o condado de Sutter, a cidade de Yuba e uma agência regional de manutenção de diques levaram à Comissão Federal de Regulamentação de Energia uma recomendação de que a operação do reservatório da barragem de Oroville considerasse uma redução do volume de armazenagem durante o inverno, em cerca de 185.022.000 metros cúbicos, resultando em um nível d’água máximo com cerca de 3,0 metros a menos.
Porém, os usuários de água do lago lutaram contra a medida, exigindo a manutenção da regra de operação imposta por um manual do Corpo de Engenheiros do Exército Americano (USACE) criado na década de 70 do século passado, quando foi construída a barragem. Essa situação de conflito de uso da água é esperada, quando a mesma estrutura é usada para abastecimento de água e controle de inundações. Tais usos são antagônicos, pois enquanto um deseja um reservatório o mais cheio possível ao final do período chuvoso, de forma a possibilitar uma maior segurança hídrica para ultrapassar os meses sem chuvas, o outro deseja uma operação com maior volume de espera, ou seja, mais vazio, possibilitando melhor amortecimento de eventuais ondas de cheia.
Outro fato histórico também coloca em situação delicada as autoridades regulatórias federais: em 2005, um pedido para investimento na melhoria do vertedor de segurança foi rejeitado. O investimento, da ordem de 100 milhões de dólares, deveria aumentar a resistência da estrutura a jusante, com uso de concreto, visto que sua susceptibilidade a ocorrência de erosão já era conhecida.
O segundo ponto da discussão, acerca da necessidade de atualização de regras de operação, traz ainda a urgência de se entender melhor possíveis efeitos das mudanças climáticas no regime de tempestades locais. Muita informação foi registrada nesses quase cinquenta anos passados e não aproveitá-las é, no mínimo, irresponsável.
Englobando toda essa discussão, estão os planos de segurança de barragem, que ainda estão engatinhando aqui, south of the border. Precisamos com a máxima urgência exigir dos detentores de barragens que apresentam potencial de dano, caso haja rompimento, que elaborem de forma responsável e criteriosa seus planos de segurança e de ação emergencial. Porque, enquanto estivermos desamparados desta forma, depois que acontecer a tragédia, será sempre aquele mesmo blablabla: a culpa é de quem?
A AquaFluxus vem investindo na prestação de serviços para planos de segurança de barragem que envolvem a modelagem matemática da onda de ruptura hipotética de grandes estruturas de barramento de rios (dam break). Esses estudos permitem o mapeamento das áreas de risco com maior potencial de sofrer danos, tanto em possíveis eventos de ruptura da estrutura, como em ocorrência de grandes cheias. Do resultado desse mapeamento, são elaboradas ações emergenciais para mitigação de prejuízos.
Não vamos esperar outra Mariana para tomar providências reais.
Abraços