Foto de capa: cena do filme It: Chapter One (2017), Andy Muschietti, Warner Bros Pictures.
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Recentemente o filme “It” bateu o recorde como o filme de terror mais lucrativo dos cinemas. Na trama do longa, sete crianças conhecidas como “The Losers Club (o clube dos perdedores)” ao mesmo tempo que precisam encarar os problemas do início da adolescência, como bullying, luto e abusos, também têm de enfrentar um monstro que se alimenta dos seus medos e toma a forma de um palhaço chamado Pennywise.
O filme, que é a segunda adaptação audiovisual do livro “A Coisa”, publicado em 1986, coloca no final dos anos 80 a parte da história que se passava originalmente no final da década de 50. O cenário é a cidade fictícia de Derry (no estado americano do Maine) que como o autor já mencionou, é uma livre adaptação da cidade de Bangor. Uma das coisas que não deve ter chamado a atenção de nenhum leitor norte americano do livro, é que a pequena cidade de Derry tinha, em plena a década de 50, um complexo sistema de drenagem/esgoto existente onde o monstro/palhaço se abrigava. No entanto, no Brasil, onde na segunda década do século XXI metade da população ainda não possuem redes coletoras de esgoto, a ideia de um sistema público coletor de esgotos funcionando em uma cidade pequena 60 anos atrás é no mínimo curiosa.
No Brasil, em 1857 D. Pedro II elaborou o primeiro contrato para construção das redes de esgotamento e drenagem das cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, consideradas as maiores do Brasil já naquela época. Isso colocou o Rio de Janeiro como a terceira cidade do mundo a ser dotada de rede de esgotos sanitários, precedida por Londres (1815) e Hamburgo (1842). Somente Londres, como Capital, se antecipou ao Rio na construção de suas redes de esgotos. Apenas alguns anos depois, no final da década de 1850, as primeiras redes coletoras de esgoto surgiram nos Estados Unidos, nas cidades de Chicago e no bairro do Brooklyn em Nova York e, a primeira estação de tratamento de esgotos surgiu em 1890 em Worcester, Massachusetts.
Entretanto, atualmente, cerca de 75% da população americana tem seus esgotos tratados por uma estação de tratamento pública (não são considerados estações de tratamento privadas) e no Brasil apenas 55,2% da população tem acesso ao serviço de coleta de esgoto (cabe lembrar que serviço de coleta é a retirada do esgoto das casas por uma rede eficiente) e apenas 42,7% do esgoto gerado é tratado. No Estado do Rio de Janeiro (um dos mais ricos da Federação), mais de 23% dos domicílios urbanos não tem o esgoto ligado a uma rede de coleta e apenas 30% dos esgotos gerados no estado são realmente tratados. Cabe ressaltar que países como Espanha, Holanda e o Chile tem o percentual de esgotos tratados acima de 95%.
Para quem for ler o romance e prestar atenção nos detalhes da história, vai reparar que além do sistema de esgotos existe uma série de outros fatores que são colocados como comuns em uma pequena cidade americana dos anos 50, mas que ainda são raridades nas cidades do interior do Brasil, como uma biblioteca pública bem estruturada (com uma ala voltada ao público infantil e roda de leitura para crianças), cinema, escola e creche pública.