Enquanto muita gente joga pedra nas obras de integração do rio São Francisco, outros entoam diariamente os versos de Dominguinhos e Anastácia cantados por Gilberto Gil: Traga-me um copo d’água, tenho sede / e essa sede pode me matar.
Sem dúvida, qualquer grande obra sempre trará consigo uma penca de polêmicas, com questionamentos válidos sobre benefícios e malefícios de sua implementação. Por isso, são exigidos aprofundados estudos de impactos ambientais para o levantamento das potenciais consequências negativas da obra e quais ações mitigatórias poderão ser tomadas.
Quando vejo discussões acaloradas sobre grandes obras de infraestrutura nacional, percebo que a maior falha dos governos sempre provém de uma péssima forma de envolvimento da população na tomada de decisões. Tenho certa desconfiança que tal déficit não é por falta de conhecimento, mas sim por estratégia, a qual, quando adotada, busca afastar os olhos dos maiores fiscais do governo, a população, de suas tenebrosas transações.
Há pouco mais de uma semana, as águas transpostas do rio São Francisco chegaram ao território da Paraíba, renovando as discussões sobre o tema. De um lado, beneficiários agradecem, festejam e vislumbram um futuro menos árduo, com uma maior oferta de água na região. Do outro lado, usuários das águas do Velho Chico e ambientalistas destacam impactos negativos potenciais em um ambiente fluvial já altamente fragilizado, por décadas de descaso e exploração não planejada.
Tecnicamente falando, uma transposição deve ser realizada com uma vazão limite que não cause a degradação irreversível do corpo hídrico fonte, garantindo a melhor relação benefício/custo possível. Assim, o volume de água retirado do rio São Francisco deveria ser estimado segundo seu regime de vazões de estiagem, garantindo impactos mínimos nas épocas mais frágeis. Da forma correta, com uma boa gestão das águas, um país com o potencial hídrico como o Brasil, poderá reduzir drasticamente a penúria de parte da população que sofre diariamente com secas históricas.
O eng. Agrônomo e Pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco, João Suassuna, já alertava há muito tempo sobre questões a serem respondidas antes de se iniciarem as obras para a transposição, como quais seriam as perdas por evaporação, quem seriam os maiores beneficiados (consumo ou irrigação), como a obra seria paga e que parte seria internalizada no preço da água, entre outras dúvidas, que ainda permanecem sem respostas precisas.
Outras contribuições do eng. Suassuna dizem respeito a possíveis transposições que beneficiariam o próprio Velho Chico, com águas do rio Tocantins e de alguns afluentes ou de lagoas existentes na região, como as do Jalapão e Varedão, as quais teriam a melhor viabilidade, segundo o pesquisador.
Quando se trata de grandes investimentos em infraestrutura polêmicos, muitas questões são levantadas, acertadamente, mas há uma que deve ser respondida com igual urgência: o que acontece se a obra não for feita?Controvérsias sempre existirão, mas se quem tem fome, tem pressa, imagina quem tem sede.
Abraços
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Fonte da imagem de capa: Tom Alves / O Globo – Disponível em: <https://goo.gl/WqpLRI>
Parabéns pelo texto,sou da região centro-oeste mas consigo imaginar o que essas pessoas passam nas secas do nordeste, e mesmo essa obra tendo tantos escândalos e polêmicas envolvidas, sinto que seja maior a necessidade que se haja essa transposição, assim espero que seja feito o melhor para quem mais precisa.